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A letra que comeu o livro

 

Estou a ler

Setembro, 2015

 

Este mês, concedeu-se especial atenção a três livros: O Capuchinho Vermelho de Charles Perrault, editado pela editora Edicare; Onde vivem os monstros de Maurice Sendak; e, também, à colectânea As histórias de Pedro Malasartes - recontadas por João Pedro Mésseder.

 

 

O Capuchinho Vermelho

 

 

O livro enfocado tem a particularidade de se abrir em acordeão. No seu interior, o leitor notará que cada página é a materialização de uma moldura que pode ser projetada - caso se utilize, para esse efeito, uma simples lanterna.

O livro oferece, assim, um poderoso jogo de sedução, combinando a magia da projeção desombras com a força das narrativas tradicionais.

Onde vivem os monstros

 

A narrativa de Maurice Sendak convida os jovens leitores a visitarem um lugar habitado por monstros. Max, personagem principal deste breve conto, é castigado pela mãe após ter feito travessuras e lhe ter dito: "I'll eat you up". No quarto de Max, a narrativa adensará o topoe da viagem e forçará a confusão entre 'tempo' e 'espaço'.

A história de Sendak traz, ainda, uma importante mensagem sobre o amor. A jusante, os "amigos" monstros permitem que o leitor adulto perceba que os códigos utilizados pelos mais novos nem sempre partilham do mesmo sentido - ainda que os vocábulos são iguais. Como se torna óbvio, "I'll eat you up" é uma declaração de afeto. A montante, Max continua a receber o jantar quentinho apesar do castigo materno.  

As histórias de Pedro Malasartes

 

Com ecos de Teófilo Braga, Leite de Vasconcelos e Adolfo Coelho, João Pedro Messéder traz a cena umas das mais conhecidas personagens da tradição popular portuguesa e brasileira: Pedro Malasartes. 
As peripécias recontadas são fortemente marcadas pelo cómico de situação e permitem, ao leitor, o riso incessante.

O título foi editado pela Porto Editora e é uma das sugestões do Plano Nacional de Leitura.

Fevereiro, 2016

 

Publicado pela Tcharan editora, Era uma vez um cão apresenta uma narrativa sequencial e cumulativa. O desejo "maçador" do filho em ouvir a história do cão vai forçando, ao pai, a criação de toda uma narrativa "evasiva". Por outras palavras, o desconhecimento ou a ignorância propositada do pai em relação ao conto do cão, faz com que o progenitor crie rimas económicas mas de grande sentido lúdico. A estrutura, a progressão narrativa simples e o humor captam a atenção do pequeno leitor que absorve a narrativa com deleite.

Um livro a ler, ideal para todas as idades.

O Livro Negro das Cores apresenta um texto icónico destinado à experiência táctil. A impressão "típica" é acompanhada pelo código braille, expandindo o universo de leitores a que a obra se destina. O título permite a sensibilização para outras formas de ler e de sentir o mundo. Note-se que as ilustrações são breves pontos em relevo que solicitam o toque. Por seu turno, o texto agudiza a informação sensorial e as cores são descritas por meio de apelos sensoriais à temperatura e/ou a aromas. Paralelamente, o livro permite a sensibilização para a alteridade, para o outro e para a diferença.

Estamos ante um livro de apurada sensibilidade e gosto estético. Infelizmente, encontra-se esgotado em muitas das livrarias principais.

 

 

 

Abril, 2016

 

 

Livro sem bonecos cumpre a "promessa" anunciada pelo título e não possui qualquer ilustração no miolo do livro. Este aspeto, conforme a voz do narrador assume ironicamente, tem uma "aparente" capacidade de tornar o livro pouco apelativo e sem qualquer interesse para a criança.

No entanto, sucede-se o oposto - especialmente quando o macaco robô e o hipópotamo rabo bum-bum entram em cena. A simbiose entre o humor e o non sense adensa o elemento lúdico e é um deleite para a criança que ouve a narrativa e pede, vezes sem conta, que lha releiam.

 

 

The Pigeon needs a bath é da autoria de Mo Willems que escreve e ilustra a narrativa. O escritor é aclamado pela crítica por títulos como Leonardo, the terrible monster ou Don't let the Pigeon drive the bus!

Na história em apreço, são apresentadas, desde logo, duas opiniões contrárias: a favor e a desfavor do banho do pombo. O jogo de forças prossegue e é materializado na voz das personagens que interpelam o leitor e lhe tentam condicionar a opinião sobre a higiene do pombo. 

A combinação entre um "humor adulto" e a encenação de uma situação quotidiana e comum à criança permite, para além do riso, que o leitor simule hipóteses relacionadas com os hábitos diários de higiene. 

O livro pode ser adquirido na livraria Papa-Livros no Porto.

 

 

A obra combina as potencialidades artísticas de Ondjaki e de Danuta. O texto, que acentua o signo poético, traz a cena um conflito endógeno: um golfinho que não possui as características transversais a todos os membros da sua espécie.

Com efeito, a narrativa apresenta um curioso imagótipo, revelador de um golfinho que tem um corpo diferente e se sente, de facto, à margem dos outros golfinhos, tanto na fisionomia como no comportamento.

Estamos ante um livro que pincela a alteridade e a transformação biológica e psicológica de uma forma positiva.

O Natal também é feito de letras. Se não sabem que livros ofertar aos mais novos, não deixem de ler estas ideias:

Novembro, 2016

O texto de Manuel António Pina traz a cena episódios natalícios do imaginário universal que, durante a narrativa são reconfigurados. Ao longo dos vários contos, a literatura desmistifica a carga simbólica associada aos episódios bíblicos e adensa o signo humano. A dúvida, a incerteza e o mundano assumem papel de destaque e o amor - enquanto mensagem messiânica e de humanismo - é de uma beleza singela. Uma das leituras deste Natal.

 

 

 

  Do presépio para o universo das letras, Os animais do Natal apresentam ao leitor um olhar sobre personagens periféricas ou menos relevantes no que é atinente à quadra natalícia. As belas ilustrações completam a riqueza da prosa e são um deleite para os mais novos. Vamos partir à descoberta do amor com os camelos da nossa história?

O livro do Natal ​é uma verdadeira enciclopédia infantil sobre o tópico em apreço. De forma livre e simples, a obra fornece um compêndio de histórias, receitas, poemas, canções e ensinamentos sobre o Natal. Pelo que aglutina e pela qualidade do material coletado, trata-se de um título que devemos reler neste Natal.

Janeiro, 2017

Apesar de José Luís Peixoto não ser, tendencialmente, um autor dedicado ao público infantojuvenil, o livro A mãe que chovia é uma obra que capta o interesse do público jovem e a ele se parece dirigir.

A obra traz ao leitor a temática da aprendizagem solitária da perda, da ausência e da falta que a mãe faz ao filho. Num golpe literário, a escrita de Peixoto vai fazendo, paradoxalmente, a ausência presença através da metamorfose da mãe em chuva.

As ilustrações de Daniel Silvestre da Silva, inseridas num padrão cromático soturno, espelham e complementam o universo melancólico.

Sem dúvida, uma narrativa de feição poética que visita os abismos da natureza humana de forma inteligível a todos os públicos.

Em março, fui às compras e recheei as prateleiras aqui de casa. Vejam as minhas sugestões:

Março, 2017

De Leo Lionni, é possível ler-se o Pequeno Azul e Pequeno Amarelo. A história apresenta a amizade entre dois círculos cuja cor se adivinha no título. A força da amizade entre ambos, espelhada na criação da cor verde, permite que estes amigos redondos sejam mais do que eles próprios - facto que não é reconhecido, numa primeira instância, nem mesmo pelos próprios progenitores. A viagem das personagens tornará evidente, de forma simples e pura, que a amizade é um fantástico meio de auto e de heteroconhecimento.

Da autoria de Julia Donaldson e Axel Scheffler, lemos o fantástico título O Grufalão. A narrativa partilha a astúcia do rato e a forma como ele se torna o pequeno senhor da floresta. Tendo como único recurso o seu fantástico poder de efabulação e imaginação, o pequeno rato vai ludibriando todos os animais que o tentam comer. Sem duvida, um dos títulos para a infância que nem pais nem educadores podem ignorar. 

 

De António Lobo Antunes chega a História do hidroavião. A narrativa juvenil partilha várias coordenadas com a produção literária de Lobo Antunes para adultos. Neste sentido, é possível ler a disforia do império e, também, as histórias daqueles que a historiografia muitas vezes desconsidera: o fraco, o oprimido, o retornado, o que perdeu a voz e a dignidade. Para além da qualidade literária sempre presente nos relatos deste autor, o livro tem especial valor como retrato do outro, como espelho da alteridade, como pedaço de uma história que ficou por contar.

História de Erika relata o episódio da mais tenra idade de uma judia. Inserido numa linha cronológica bastante perto do final da segunda guerra mundial, o pequeno livro traz uma mensagem em favor da preservação da memória judaica. De facto, as ilustrações de Roberto Innocenti adensam o clima de horror e, pelo choque, impedem a facilidade do esquecimento. Sendo Portugal um pais com uma história tão ancorada à própria memória judaica, este livro pode ser um ótimo introdutor do tema.

De carácter panfletário e de formação, podemos ler as Aventuras de Nugnga que mostram a vida de um jovem guerrilheiro quando das lutas de Angola pela independência. A honra, a juventude e o idealismo de um jovem são dados a conhecer e revelados como traços de personalidade a seguir num mundo cada vez mais corrompido. A envolvência histórica, as lutas, as armas, a irreverência e os amores de Ngunga fazem desta história um relato muito apreciado pelos jovens.

Setembro, 2017

Inspirado pelo património oral queniano, chega-nos o reconto de Elsa Serra: Ungali. Nesta história, os animais tentam encontrar uma solução para a fome e para a sede. Liderados pela girafa, seguem à procura de alimento. Quando encontram a árvore mágica, tentam a melhor estratégias para saciar a fome e apoderarem-se de todos os frutos do mundo. Será que conseguem? Um livro bem ao gosto dos leitores de todas as idades. A não perder.

 

 

 

 

Janeiro, 2018

 

Um livro de cores latinoamericanas sobre uma menina que, contrariando as realidades da mãe, se veste de sonhos e tenta alcançar as nuvens. Consegue-o, por meio de todas as amizades que vai fazendo ao longo da vida para, no fim, descobrir que as suas "nuvens" tinham a felicidade no chão e na música da terra. Não deixem de ler e de saborear as lindíssimas ilustrações. 

Março, 2018

São três os livros de O. Jeffers que se apresentam aqui hoje. Perdido e achado mostra-nos um pinguim que, aparentemente, anda perdido, aparecendo às portas de um menino. Pela força da amizade, o cronótopo e o signo da viagem são ativados. Por outras palavras, o menino tenta de tudo para acabar com a solidão do pinguim que estava tão solitário e tristonho, arriscando, inclusive, uma viagem ao Pólo Norte.  Um belo livro que mostra o quão forte a amizade pode ser, mas que nos relembra, também, o quão importante é o diálogo antes de qualquer tomada de decisão.

Por seu turno, Presos conta uma história fantástica sobre um menino que perde o seu papagaio vermelho nos ramos de uma árvore. Para resgatar o papagaio, ele conta com a sua inesgotável e fantasiosa astúcia e, também, imaginação. Um livro fantástico, de fazer sonhar, que nos relembra que, por vezes, atirar uma baleia de encontro a uma árvore pode não ser a melhor forma para recuperar um papagaio de papel. Ou talvez seja... quem sabe?

Quanto ao Incrível rapaz que comia livros, estamos ante uma narrativa que nos dá conta de um rapaz com uma peculiar dieta: ele come livros. Assim mesmo, de boca! À medida que os come, vai ficando cada vez mais esperto e mais esperto! Pode parecer, assim a quem lê estas linhas que o Henrique - nome do rapaz que come livros-, poderá não ficar muito bem na biblioteca lá de casa. Imagine-se o perigoso que será ter um rapaz que come livros na nossa biblioteca! Convém fechar o livro depois de o ler para que este rapaz de apetite fantástico não faça das suas. Ou, talvez, esperar que como por magia, ele aprenda o prazer da leitura. Vamos ler para descobrir.

 

Outubro, 2018

 

A génese do livro deve-se à composição musical de Camille Saint-Saëns intitulada com o nome e que alcançou elevada reputação após a morte do compositor. Importa referir que a obra se caracteriza por um forte pendor humorístico e satírico. Este aspeto é percetível na intermusicalidade, ou seja, o músico apropria-se de composições de reputação universal e reconfigura-as, criando um divertido carnaval. Editado pela Kalandraka, o título concilia o texto de Abad Varela e a interpretação musical que é concretizada pela Academia de Londres.

 

Texto de Txabi Arnal e ilustração de Ângela Barroqueiro, editado pela OQO.
O título traz a cena um velho alfaiate que vai remendado os corações alheios e, de certa forma, também o seu, por meio do seu ofício mágico e das suas virtudes humanitárias.

Fevereiro, 2019

 

Da autoria de Isabel Minhós Martins e Madalena Matoso. É um livro editado pela editora Planeta Tangerina. Trata-se de um conto que nos apresenta as relações de vizinhança e, também, as oposições entre a autoimagem e a hétero-imagem num curioso jogo de espelhos.

A personagem principal, a Joana, vivia num prédio relativamente pacato no qual quase nada acontecia. A chegada de um novo vizinho, um cão, irá alterar de forma indelével o modo como ela perceciona os outros e como com eles se relaciona.

Da autoria da britânica Emily Gravett, "Arrumado" é um livro que nos apresenta um texugo que levou a sua obsessão por limpezas demasiado longe. Um título para refletir sobre os limites da ação de cada um.

 

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